Provavelmente a história foi assim: 1988, começa o burburinho em torno da formação de uma mega banda composta por Bob Dylan e George Harrison. Meses depois, a Veja revela a história. A banda era composta por Dylan, Jeff Lynne (ex-Love e ex-Elo), Tom Petty, Harrison e Roy Orbison (retirado de um ostracismo de 15 anos, causado por
tragédias pessoais).
Por problemas contratuais com suas respectivas gravadoras, o quinteto não podia assinar o disco com seus verdadeiros nomes e eles tornavam-se, momentaneamente os irmãos Lucky (Dylan), Otis (Lynne), Nelson (Harrison) e Lefty Wilbury (Orbison), acrescidos do primo mais novo, Charlie T. Jnr (Petty).
Logo depois, o Fantástico exibiu o clipe de “Handle With Care” e contou a história triste de Roy Orbison (ele receberá um capítulo à parte neste blog), que após gravar com os Wilburys, retomou a carreira e faleceu justamente no dia que seu maior sucesso após “Pretty Woman”, “You´ve Got it”, era lançado.
“Uau!”, pensei, “eu tenho que ter esse disco”. Lembro até hoje dos meus parcos pelos de garoto de 15 anos, arrepiados com a matéria do Fantástico. Não demorou muito, juntei uns caraminguás, provavelmente catando garrafas e jornais na escadaria do Ouro Verde, com a ajuda de mamãe, claro, comprei o disco The Traveling Wilburys.
E que disco! E a razão de seu sucesso é que o supergrupo não criou super expectativas, já que manteve tudo no maior sigilo possível e não excursionou. Pela primeira vez um disco meu emocionava meu pai. “Rattled”, cantada por Lynne, tinha uma batida country acelerada, que lembrava baião com rastapé e mexia com ele, que pediu para que eu gravasse a música numa fita. Orbison emocionava com “Not Alone Anymore”, Dylan, com “Congratulations” e Harrison, com “Heading For The Light”.
Como na música, uma coisa leva a outra e comecei a pensar: e esse Tom Petty, hein??? Logo depois, em 1989 mesmo, ele lançava seu primeiro álbum solo, o Full Moon Fever, que “só” tinha “Free Fallin”, “It Won´t Back Down”, com direito a Harrison tocando violão (o clipe mostra Ringo Starr na bateria, mas quem toca mesmo é Phil Jones), “A Face in The Crowd”, e uma cover sensacional de “Feel a Whole Lot Better”, que me levou aos Byrds (que terão inúmeros capítulos a parte neste blog).
Com a popularidade dos Wilburys, que não podiam excursionar, Petty tornou-se um artista conhecido mundialmente, o que não havia conseguido plenamente com seus álbuns com o Heartbreakers até então. Aliás, não foi só Petty e Orbison que aproveitaram a onda Wilburys. Harrison, não antecipação causada pelo burburinho, lançou o lindo Cloud Nine (1987) e Mr. Dylan, Oh Mercy (1989).
Minha busca por Petty continuou. Lembro que uma tarde fui com o Mauro na casa de um colega de escola dele, que morava numa cobertura na Vila Rica (era a primeira vez que entrava numa cobertura e a primeira vez que entrava num prédio na Vila Rica, microbairro de Santos por onde só passava a caminho da escola). O cara vivia viajando para os States e adorava Petty. A cada ano, trazia as novidades, até o chato Southern Accents (1985), produzido pelo chapa Dave Stewart.
De qualquer forma, não foi lá que conheci o singelo Long After Dark (1982), que tem o clássico “You Got Lucky”, de sonoridade new wave, e afetado, claro, pelo som americano dos anos 80, cujo clipe eu conheci em um especial do Petty exibido pela Manchete. Dez anos depois, em outubro de 1992, o disco estava na minha coleção.
O álbum tem também as ótimas “Deliver Me”, “We Stand a Chance” e “The Same Old You”, com a melhor formação da banda: o parceiro Mike Campbell, na guitarra solo, o brilhante Benmont Tench (teclados), Stan Lynch (bateria) e o chapadão Howie Epstein (baixo, morto em 2003).
Dois meses depois comprei, ainda em vinil, Into The Great Wide Open (1991), o retorno de Petty com a formação clássica dos Heartbreakers, com participações do produtor e parceiro Jeff Lynne em várias faixas e de Roger McGuinn (Byrds), no coro de “All The Wrong Reasons”.
Esse disco foi o meu presente de Natal de 1992. Uma viagem por sonoridades americanas, o disco já começa por sua bela capa: um detalhe do quadro “Landscape”, de Jan Matulka, de 1926, quase naiff, na contracapa, uma bela tapeçaria, meio indígena, emoldura a foto da banda.
O álbum é perfeito. Tem o hit “Learning to Fly”, a belíssima “The Dark Of The Sun”, um álbum extremamente estradeiro, como sempre acaba sendo com Petty, com suas histórias belíssimas, como a do porteiro de boate, Eddie, que queria ser star, e vai para Hollywood tentar a sorte assim que termina o colegial, na faixa-título.
Petty ainda gravou discos belíssimos, como o solo Wildflowers (1994), mas minha busca por seu trabalho concentrou-se mais no som dele nos 80 e começo dos 90. Em 1998, em Praga, achei numa liquidação Damn The Torpedoes (1979), que abre com o tríptico clássico “Refugee”, “Here Comes My Girl” e “Even The Losers”, todas velhas conhecidas do especial da Manchete anos antes. O disco, produzido por Petty e Jimmy Iovine e o engenheiro de som Shelly Yakus, que depois trabalharam com o U2, tem uma sonoridade bem 80´s, apesar de as raízes do cantor/compositor/guitarrista estarem todas lá. Pois é, mais uma vez, uma coisa leva a outra.
P.S.: Tenho também do Petty o álbum Let Me Up, I´ve Had Enough (1987), que tem “Jammin´Me”, parceria com Dylan, mas não gosto do disco.
Other Stuff: Wilburys, Long After e Into The Great, vinis nacionais originais em edição completa, com encartes. Full Moon, edição nacional original em CD, com encarte completo, com letras e fotos. O Damn tem edição alemã, com encarte mostrando todo o catálogo de Petty até 1993.
Cotações:
Traveling Wilburys, The Traveling Wilburys (1989) - *****
Tom Petty, Full Moon Fever (1989) - *****
Tom Petty and The Heartbreakers, Damn The Torpedoes (1979) - ****1/2
Tom Petty and The Heartbreakers, Long After Dark (1982) - ***1/2
Tom Petty and The Heartbreakers, Into The Great Wide Open (1991) - ****