sábado, 2 de agosto de 2008

U2, Rattle and Hum (1988)


direção: Phil Joanou

Voltamos 20 anos no tempo. Aos 14 anos minha vida estava numa encruzilhada. Como um bom adolescente nerd, cdf, inteligente, cegueta, etc e tal, meia boca nos esportes e péssimo com as garotas, minha vida era absolutamente miserável. Mas, Deus me deu uma chance: eu tinha bons amigos e Santos tinha uma rádio rock.

Lembro muito bem. Era 1987 e o U2 tinha lançado The Joshua Tree. Às vésperas do Grammy de março de 1988, a 95,3 FM, a antiga rádio rock de Santos, tocou “Where The Streets Have no Name”, o novo single do U2. E eu pensei comigo mesmo: “cacete, que porra é essa?, isso é que é música!”.

A mesma rádio tocava naquele outono “The Dead Heart”, do Midnight Oil, “Strangelove”, do Depeche Mode, “Perfect Kiss”, do New Order, “Tears Run Rings”, com Marc Almond... Acho que até Billy Brag tocava nessa rádio, Stray Cats... Putz, era sensacional. Era uma rádio dentro de seu tempo, não o que gente vê nas rádios rock de hoje, que só tocam clássicos ou só o lixo do momento, e não encontram mais um ponto de equilíbrio. A 95 procurava tocar o lado B também. Lembro de um especial fantástico sobre Joy Division, outro sobre o Velvet Underground, o primeiro com um texto emocionante, salvo engano do grande Lane Valiengo.

Dali em diante, minhas noites solitárias, ouvindo música romântica deprê na Tribuna FM, curtindo alguma fossa deprimente por causa de alguma garota bonitinha da escola ou porque tinha perdido no jogo da escolinha de basquete ou sido o penúltimo ou último escolhido na educação física, já eram. Foda-se, eu era agora um soldado do rock and roll. Havia encontrado meu Deus e minha cura.

U2, claro, passou a ser uma obsessão. Comecei a ir atrás de tudo deles. O primeiro “disco” foi uma fita k7 oficial do Joshua Tree. Logo arrumei alguém que tinha o disco e xeroquei as letras, ou copiei a mão mesmo. Um belo dia saiu a notícia de que sairia um filme, pois é, gente, um filme de cinema, com o U2!!!! Era o máximo que eu poderia chegar perto de Bono, Edge, Adam e Larry.

Esse filme era Rattle and Hum e ele mudou minha vida de novo. Lembro que fui ao cinema na primeira semana de exibição, num dia de semana, salvo engano, uma quarta-feira, à tarde. No cinema encontro um grande amigo meu que não vejo há anos, o Cirano. Ele era o meu ídolo. Um pouco mais velho, Cirano era o bad boy da escolinha de basquete. Baiano, diferente, cabelo jogado para cima, era realmente um rock star, sem saber.

Lembro o dia que ele me convidou para ir até a casa dele e me deu uma lata de spray e pediu para que pixasse o quarto dele. A mãe dele era super liberal. E ele tinha amigos que fumavam (cigarro) e bebiam e ele bebia e fumava também. Mesmo passando longe da piração, eu pirava com a música. Teve outro dia genial em que eles apagaram a luz e a gente ficou viajando, uns 40° C do lado de fora, ouvindo Psychocandy, do Jesus, e o Viva Hate!, do Morrissey.

Bem, foi uma surpresa encontrar o Cirano no Indaiá porque fui eu que apresentei U2 para o Cirano e ele sempre falava mal. A opinião dele só mudou um pouco depois que eu levei o “Unforgettable Fire” para ele. Encontrei o cara no final da sessão, chorando, e ele falou: “Vamos ficar quietinhos aqui na frente que a gente vê o filme de novo”... Hahaha, foi demais...

O que era aquilo? Que força era aquela que movia o U2 naqueles tempos? Eles queriam o mundo. E nos apresentaram outro mundo, cruzando a América daquele jeito. Quem viu esse filme e não chorou na cena em que o Larry se emociona ao falar de “Granceland”? Ou estranhou a forma cortês e irlandesa de ser durante o false start de “Angel of Harlem”. E a grande sacada do U2 e do diretor Phil Joanou que, principalmente, é um grande fotógrafo de cena, foi não apenas filmar o tour de “The Joshua Tree”, mas a viagem do próprio U2 no rock americano.

Foi a primeira vez que ouvi “All Along The Watchtower”, “Ruby Tuesday”... Foi a primeira vez que ouvi falar de Charles Manson, “Helter Skelter” (nenhum amigo meu tinha, na época, o “Álbum Branco”). Nossa, ver uma apresentação de “Bad” ao vivo era impensável naqueles tempos. A música renasce no filme, mas ficou de fora da trilha em disco, uma vez que já tinha recebido uma versão ao vivo no EP “Wide Awake in America”.

Saí do cinema decidido que fazer música seria minha vida. Três anos depois, minha primeira e modesta banda, a então Nowhere Band, estreava no palco da escola estadual onde estudava. Tinha 17 anos. Vivi o sonho por mais cinco anos, até 1996, quando o jornalismo me levou para outra dimensão, mas nunca te esqueci Rock and Roll.

4 comentários:

Mallu Santos disse...

O Cyrano não leu ainda pq não anda entrando no Orkut, mas eu imprimi e vou levar pra ele. Ahhh... Quem sou eu?A Mallu, mulher do Cyrano e mãe da Valentine, a menina mais linda do mundo...rsAbraço

MO disse...

Muito, muito obrigado mesmo. Tenho muita saudade do Cirano, uma pena que perdemos o contato em meados dos anos 90. V a filha de vcs. Coisa fofa!

Marcos Sergio disse...

Somos todos escravos do rock. Eu desde os 14, pelos mesmos motivos que você enumera

Anônimo disse...

Muito bom o texto Zoyd. Descrever essas descobertas numa época em que também fazia as minhas é sempre gratificante. Ver como vocês fez as suas.
Parabéns!!!